Diário da Peste (XXIV) - Corpus Christi

Feriado em Porto Alegre. Dia ameno de outono. A temperatura chegou a 22ºC. Um belo dia de sol. Era outono mas podia ser primavera. 

Porto Alegre tem um clima ameno na maior parte do tempo. Anteontem eu estava ouvindo um podcast de um francês radicado em Varsóvia. Na época da publicação do podcast era verão em Varsóvia. O podcaster estava feliz porque no verão de Varsóvia a temperatura variava entre 10ºC e 20ºC. 

Me pergunto qual o sentido de termos um feriado religioso desses hoje em dia. Qual o percentual da população brasileira é católica ainda? Dentre esses, quantos vão à missa regularmente? Quantos participarão de alguma cerimônia religiosa hoje, mesmo que virtualmente dado que vivemos um tempo de peste? 

Eu fui batizado católico em criança, me tornei protestante evangélico, e hoje sou praticamente nada. 

Não me entendam mal, não sou contra o feriado, mas talvez devêssemos transformar feriados religiosos em feriados civis, uma vez que a religião mais e mais perde protagonismo, mesmo que muita gente mantenha sua fé em privado. 

Aliás, por que mesmo ainda temos jornada regulamentar de quarenta e quatro horas semanais de trabalho? Por que tanto tempo dedicado ao trabalho se se paga tão pouco? A propósito ainda, nos países do extremo oriente as jornadas vão além, às vezes para sessenta horas semanais, com férias anuais de sete dias. E chamam de preguiçoso quem se rebela contra isso. O patronato nesses lugares deve estar muito feliz (vejam legislações trabalhistas em Indonésia, Japão, Malásia, China Continental, China Taiwan, etc). 

Ainda pela manhã, o aplicativo de fotos me mostra o que acontecia por esses dias há um ano. Então já estávamos com mais de três meses de confinamento, sem perspectivas de fim, embora nos imaginássemos no início uma quarentena, ou seja, mais ou menos uns quarenta dias, sessenta no máximo. O aplicativo me mostra fotos da bisnagueira em frente à minha janela ainda plena de flores. Este ano a bisnagueira não está florida com sua flores cor de laranja. Não no pátio do condomínio. Contudo há algumas bisnagueiras nas ruas aqui da região, e elas estão sim floridas. 

Bisnagueira, mais uma árvore exótica nas ruas de Porto Alegre, como as extremosas com suas flores cor de rosa, os ligustros com suas florezinhas brancas e o venerando eucalipto. 

O aplicativo de vídeos me informa do lançamento de novo clipe do U2. Until The End of the World. A música foi lançada no álbum Achtung Baby, de 1991. Há trinta anos portanto. Como Bono e a turma nos seus presumíveis 30 anos. Me parece que foi ontem. 

"We were as close together as a bride and groom / We ate the food, we drank the wine / Everybody having a good time / Except you / You were talking about the end of the world" * 

Foi em 1991, mas em minha cabeça foi como se fosse em 1987, não sei porquê. Ou talvez eu saiba, 1987 foi o lançamento do disco Joshua Tree do U2. U2 se tornou mega então. 

"Until the end of the world" também foi um filme de Wim Wenders, lançado em 1991, estrelado por Solveig Domartin, William Hurt e Sam Neill. Que sempre me faz pensar com ironia que o fim do mundo é o deserto da Austrália. 

Solveig Domartin era uma atriz francesa, que foi casada com Wim Wenders, e morreu em 2007, aos 45, de um infarto. A vida passa muito rápido. Para alguns mais rápido ainda. 

Dia 3 de junho de 2021 foi uma quinta-feira. Feriado de Corpus Christi em Porto Alegre. Havia sol e a temperatura chegou a 22ºC. Os parques estavam cheios, apesar da peste. Um dia ameno de outono. 

* Estávamos tão juntos como um noivo e uma noiva / comendo a comida, bebendo vinho / todos desfrutando o momento / menos você /  você estava falando sobre o fim do mundo" 

04, 08/06/2021.