Gatinho
O gato era cinza. E branco.
Mais cinza do que branco.
Era um filhote então. Um gatinho.
Foi adotado por uma senhora no outono da vida.
Ou, talvez, no inverno da vida.
Para completar o clichê, talvez, uma solteirona que criava gatos.
Só no outono de sua vida, aí sim, passou a acolher os felinos.
O gato foi tomada por uma gata.
Recebeu nome de personagem feminina da novela das oito. Nome esse já esquecido.
Um exame mais detalhado constatou: não era uma gata.
Um gatinho. Gatinho, o nome ficou. Gatinho, o nome, ficou.
Um dia, a dona do Gatinho foi afligida por dores.
Dores no abdômen, dores nas costas.
Consulta daqui, pesquisa dali, perscruta acolá, e chegou-se a um diagnóstico. O pâncreas tinha um tumor.
E nove meses depois, um tumor no pâncreas levou a dona do Gatinho.
Que foi herdado pela ex-cunhada da falecida dona.
E foi bem tratado pela ex-cunhada da falecida dona.
E ali até viveu bem.
Uma vez fugiu.
Mas voltou dois dias depois.
Ali até viveu bem.
Contudo houve um problema.
A ex-cunhada da falecida dona tinha um cachorro.
E entre os dois machinhos começou uma disputa por demarcação de território.
Assim o Gatinho passou a mijar fora da caixa, mijar pelos cantos.
Transtornada, a nova dona transferiu o Gatinho.
E por anos ele foi viver com o irmão da primeira dona.
E ali até viveu bem.
Nos dias quentes dormia encostado no novo dono.
Nos dias frios dormia sobre o novo dono.
Todos os dias comia, bebia e dormia. Mais dormia do que comia e bebia.
Foram uns poucos anos de uma convivência, em geral pacífica.
Embora com alguns momentos de stress.
Momentos de stress: cagar fora da caixa de areia.
Momentos de stress: comer até se empaturrar e depois vomitar.
E assim, após alguns anos, o Gatinho voltou à dona anterior.
Os tempos mudaram.
O cachorrinho rival tinha morrido. Não havia mais competição entre dois machinhos.
O tempo passou.
Gatinho, apesar do nome de filhotinho, já era velhinho.
E assim, mesmo velhinho, Gatinho viveu bem.
Boa ração, bons sachês de carnes variadas.
Em sua longa vida, Gatinho foi apelidado no final de Gatinho Guinness Book.
Pois, talvez, o que ele vivera poderia ser considerado um recorde.
Pena que nunca foi registrado oficialmente.
O tempo chega para todos.
A indesejada das gentes também pode ser a indesejada dos bichos.
Gatinho se recolheu. Gatinho se introverteu.
O que será que pensou? Pensa um gato que sua hora chegou?
Por fim. Gatinho morreu.
Se juntou à sua primeira dona.
Se juntou ao seu antigo rival.
Sim, pois é. Uma pena.
Gatinho morreu. Por fim.
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28, 29/09/2025.
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