Diário – leituras – Horas íntimas: Master Class Santa Sede para Vinicius de Moraes


A gente lê uma obra e diz para si mesmo que daqui a pouco vai escrever alguma anotação a respeito. Quando vê, já se passou quase meio ano desde o final da leitura. Foi o que aconteceu comigo com o livro Horas íntimas: Master Class Santa Sede para Vinicius de Moraes. Eu adquiri o livro no seu lançamento, perto do final de 2021. Terminei de lê-lo perto do final de 2023 (e aqui um esclarecimento: eu não comecei a lê-lo imediatamente após a aquisição. Houve um bom espaço de tempo em que ele ficou na fila à espera de leitura). Estou escrevendo no final de fevereiro de 2024. 

Horas íntimas é mais um livro produzido pela Oficina Literária Santa Sede, em suas masterclasses (e me dou conta aqui que costumo escrever “masterclass” assim, tudo junto, e aqui no título está “Master Class”, separado e com maiúsculas), que anualmente homenageiam cronistas. 

Horas íntimas tem certas peculiaridades. 

Como Vinicius é muito mais conhecido como poeta, inclusive tinha o apelido de Poetinha, este livro tem poesias como parte de seu conteúdo, e não apenas crônicas.

A segunda peculiaridade é que o livro foi desenvolvido no segundo ano da peste, isto é, da pandemia de covid-19. E isso se reflete em algumas das crônicas que compõem o livro, que comentam a epidemia. Ele acaba por ser, de alguma forma, um testemunho dessa época. 

A terceira peculiaridade é que o livro foi produzido através de encontros virtuais, (já que a pandemia demandava disatanciamento social), uma sequência de videoconferências em que os cronistas se comunicavam. Mesmo que o livro se chame Horas íntimas, certamente em virtude do caráter da obra do homenageado, como diria nosso amigo Gian, Vinicius, mais do que alguns outros homenageados da Santa Sede, merecia uma oficina realizada no bar, como é a praxe quando não vivemos dias de apocalipse. Talvez o organizador da oficina, o Rubem, pense em uma segunda homenagem a Vinicius daqui a algum tempo. 

Os textos, como em geral acontece com a curadoria do Rubem, são de boa qualidade. Alguns emulam bem Vinicius, alguns demonstram a influência do Poetinha, e em alguns outros, por fim, os autores tomaram as liberdades que o organizador permitiu. 

Gostaria de destacar quatro dos, se não me engano, setenta e cinco textos do livro. 

Um é o Soneto fúnebre do Rubem, Rubem Penz. Sim, Rubem compôs um soneto, uma poesia. Grande influência de, e homenagem a, Vinicius. 

O segundo é Tristeza exponencial, a crônica-conto (conto crônica?) de Luca Boaz, suposta memória que nos dá um susto, e, de fato, nos enche de tristeza. 

O terceiro é Amores seremos de Amélia Mano. Esse poema me remeteu às letras das canções de Chico Buarque. 

Por fim, destaco o Soneto para Amada, que partiu, de André Hoffmeister. Outro soneto. Outra poesia. E nesse me pareceu que baixou um Vinicius em André. 

Destaco quatro mesmo havendo setenta e cinco bons. Se eu escrevesse duas linhas para cada um, esse texto se espalharia pelo equivalente a mais quatro ou cinco páginas. Ficaria cansativo para mim e para quem lesse.

Vou me permitir reproduzi abaixo o soneto de André, de que gostei tanto. E com isso terminarei esse registro de leitura. 


Soneto para Amada, que partiu


Pois se me foste norte, fiz-me vento

E em compasso lento voei o mundo

Rosa voltada ao meu amor profundo

Que tracejei por ti no firmamento


Pois se me foste chama, fui desejo

Inflamando em brasa esta gana tanta:

Clamar teu nome preso na garganta

“Amada!” – quanto mais, minha te vejo


Me atormenta agora, o tempo passado

(Vago só e perdido em sonho embaçado)

Se foi real a paixão que me deste…


Mas se num dia, ah meu Deus, tu voltares,

Essas cismas sumirão pelos ares

Pois me és amor, fiz-me teu inconteste



24/02/2024, 05/03/2024.

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