Cara Maria – XV – Gracias por tu vida
Cara Maria,
Melhor usar meu macarrônico espanhol para agradecer por tua vida. Nesse caso acho melhor dizer “gracias”, que “obrigado”, que carrega obrigação junto de si. Se fosses uma crente cristã eu diria graças a Deus pela tua vida, como acho que não és, vale ser grato por estares aqui e por aí, sem proselitismos.
Desde que te escrevi há duas semanas, passou o bloqueio. Foi como se uma rolha ou uma tampa fosse retirada dos pensamentos, para que eles pudessem fluir e voltar a formar textos.
Continuo acompanhando teus textos.
No anterior, se tudo der certo, mais atividades físicas no próximo verão, sem a atrapalhação de lesões.
No de hoje, por que se pensa pouco nas vítimas da violência sexual? Em especial se o violador é famoso?
E seguimos acompanhando a tensa situação da invasão da Faixa de Gaza.
Recentemente li um artigo do jornalista Thomas Friedman cujo título é “Netanyahu tornou Israel radioativo pelo modo como conduz guerra em Gaza”. É um longo texto relembrando o ataque do Hamas em outubro passado, falando desta reação desproporcional de Israel, e ainda relembrando a invasão do Iraque pelos Estados Unidos e como aquilo deu muito errado por falta de planejamento, e como uma falta de planejamento semelhante pode estar levando Israel para um caos ainda pior em Gaza. Como eu disse, é um longo texto.
E ele termina assim:
“Israelenses e palestinos são interdependentes. Perde-se lá, sente-se aqui. A única questão é se um dia eles conseguirão forjar uma interdependência saudável ou se estarão condenados a uma interdependência doentia. Mas eles serão interdependentes. Cada comunidade precisa de um líder cujas ações sejam motivadas por essa verdade fundamental. No momento, nenhuma delas tem um.”
Sim, a atual interdependência é doentia.
E Israel vive um paradoxo. Se apresenta como a única democracia do Oriente Médio; isso pode ser verdade para quem viva dentro das fronteiras históricas de 1948-1967. Os palestinos que vivem nos dois terços da Cisjordânia controlada pelo exército de Israel vivem sob uma autocracia, com risco de prisões por tempo indeterminado sem julgamento. Centenas deles estão presos desse jeito. Acredito que são esses para quem o Hamas quer a libertação em troca dos reféns sequestrados em sete de outubro. Ora, o atual governo de Israel não quer permitir a criação de um Estado Palestino na Cisjordânia e em Gaza. Então, para ser um estado verdadeiramente democrático, Israel deveria conceder direitos de cidadania aos palestinos, já que aparentemente seus governantes parecem apostar na solução de apenas um Estado, do Mediterrâneo ao Jordão. Porém, se fizer isso, o Estado de Israel deixará de ser um estado com a maioria da população judaica, como é seu propósito.
Sinto falta de Tzipora “Tzipi” Livni, aquela antiga ministra israelense que lutou pela solução de dois estados, depois de se convencer que essa seria mesmo a solução para paz e segurança de Israel. Infelizmente, por conta das mudanças políticas em Israel, ela deixou a vida pública.
Ficamos aqui, tristes, impotentes, lendo e ouvindo notícias de mulheres e crianças morrendo baleadas, bombardeadas, soterradas, morrendo também de fome, de frio e de doenças.
Israel tem o direito de se defender. Mas o que acontece é defesa ou vingança?
Repito: sou grato pela tua vida. Continuemos trocando ideias. Abraços!
23, 26/03/2024.
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