Sem lugar tranquilo


José chegou ao bar desacorçoado. 

Quando ele chegou,  eu e Marcos já estávamos ali. 

Ele havia nos enviado mensagem informando a questão. Seu carro foi arrombado enquanto ele precisou ir na farmácia. Muitos remédios, farmácia cheia, talvez 45 minutos lá. 

“É, João. Uns 45 minutos foi o suficiente para algum vagabundo quebrar um vidro, abrir a porta, invadir o carro, roubar o estepe e ir embora. Em uma travessa da Protásio, no bairro Santa Cecília. Área nobre e residencial. Início de noite de primavera. Até então era um início de noite agradável.”

“Sim, sei. Já aconteceu comigo. Já te falei daquela vez que roubaram dois pneus do meu carro e o deixaram apoiado em tijolos, né?”

Marcos olhou para um e para o outro de nós e retornou sua atenção para o celular. 

“É, João. Sim, tu contou. Também não foi a primeira vez que aconteceu comigo. Já tinham roubado um estepe meu lá perto de casa. Mas é uma região mais afastada. E era tarde da noite. Outra vez invadiram uma velhíssima Brasília, que eu tinha, para roubar a bateria. Também foi tarde da noite, inclusive era uma noite chuvosa quando levaram a bateria. Agora foi em um bairro nobre, num início de noite.”

Marcos tomou um gole de cerveja e continuou olhando o celular. 

“Que que eu vou dizer, José? É. Não tem lugar tranquilo, lugar seguro para deixar o carro estacionado na rua em Porto Alegre.”

José respirou forte.

“O que será que é feito com isso? Para onde são levados esses pneus? Ainda roubam baterias?”

Pensou um segundo.

“Não convivemos com tanta miséria ao redor impunemente.”

“A miséria é real, José, mas não é tudo. Esse tipo de ladrão sabe o que procura e como alcançar. Ele tá ali pela maldade.”

Mais silêncio. Nós dois tomamos nossos goles. Ficamos olhando para o Marcos. 

Ele levantou os olhos do celular e nos fitou por uns segundos.

“É.” Disse. 


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Imagem gerada com o Whisk


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27, 28/10/2025.

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