Diário - teatro - Simplesmente Eu, Clarice Lispector


Diário - teatro - Simplesmente Eu, Clarice Lispector


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Quando eu informei um colega que iria ao teatro assistir um monólogo com textos de Clarice Lispector, ele logo disse que se fosse ao teatro para assistir a um monólogo, o resultado certamente seria que ele acabaria por dormir. Talvez ele tenha confundido monólogo com monocordia, isto é, uma pessoa narrando qualquer coisa no mesmo tom monótono. Talvez ele nunca tivesse assitido algum a algum monólogo teatral.


Pois na sexta-feira passada, dia 3, fui ao Teatro São Pedro para assistir a atriz Beth Goulart encenar a peça “Simplesmente Eu, Clarice Lispector”, em que ela, Beth Goulart, interpreta tanto a escritora Clarice Lispector, quanto algumas das personagens criadas por Clarice Lispector.
Clarice Lispector foi uma escritora e jornalista brasileira, que viveu entre 1920 e 1977. Havia nascido na Ucrânia, mas chegou ao Brasil em 1922 junto com seus pais, fugindo da guerra civil que se seguiu à Revolução Russa. Escreveu romances e contos, entre eles “A Paixão Segundo G.H.” e “A Hora da Estrela”. Escritora introspectiva, li em algum lugar no Internet, que ela é muito citada no “Twitter”.


Pois Beth Goulart dá nova vida a Clarice com esta peça. Sim, pois quando Beth encarna Clarice durante a peça, é como se estivéssemos novamente diante da autora (há alguns vídeos com entrevistas de Clarice no YouTube). Beth Goulart realmente se dá ares de Clarice Lispector. Nas roupas, na linguagem corporal, no jeito de falar. Jeito de falar singular, pois a autora tinha problema de língua presa, motivo pelo qual algumas pessoas a interpelavam se isso não seria algum sotaque russo ou ucraniano.


Beth Goulart retoma textos autobiográficos de Clarice e os interpreta. Também reproduz entrevistas de Clarice dadas à televisão. Estas mesmas disponíveis no YouTube.


E alterna a vivência de Clarice com as de suas personagens. Para isso se vale da iluminação do palco, e das trocas de figurino que vão acontecendo diante da plateia. com uma série de vesitidos muitos práticos. Três abotoaduras, feitas ou desfeitas, e um vestido é trocado por outro.


Há colocações muito comoventes. Por que ela escrevia? Ora porque alguém respira? Isso era natural para ela. E por que, depois de tantos anos, ela ainda escrevia? Esta era uma pergunta ofensiva. Quem fez a pergunta achava que a obra dela já estava acabada? Poderia ser dada por concluída?


Há as personagens, como a Joana, de seu primeiro romance, “Perto do Coração Selvagem”. Ou uma dona de casa que um dia sai e perde o ponto do bonde.


E há ainda uma oração, reflexo da educação judaica que Clarice teve na juventude, na forma do cântico de um salmo. Talvez a reprodução de algo ouvido em uma sinagoga.


Não, eu não dormi durante a apresentação de Beth Goulart. E acredito que ninguém na plateia dormiu. A concentração era total. Mal e mal se ouvia um cadeira rangendo, ou alguém tossindo. E no final do espetáculo, a atriz foi aplaudida de pé.


Uma peça comovente, como os escritos de Clarice Lispector.


Ainda houve tempo para Beth Goulart agradecer o carinho dos espectadores, e a inspiração de Clarice. Além disso, a produção da peça ainda sorteou dois livros de Clarice.



05/08/2012.

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