Diário da Peste (II) - Tele-Entrega - 03/04/2020


Tenho lembrado muito a questão, que a pandemia me remete para as pestes que, desde a Antiguidade até o início do século XX, flagelavam a humanidade. 

Devo dizer que o momento que atravessamos tem a peculiaridade de estar em sua própria circunstância. É meio redundante dizer isso, mas faço questão.

Não sei se em outros momentos da história da humanidade, houve o serviço da tele-entrega. Bom levando em consideração que o telefone é uma invenção do século XIX, antes disso não deve ter havido tão literalmente a tele-entrega, parecida com a que conhecemos. 

Mas uma situação única é esta que estamos vivendo na primeira metade do século XXI. 

Acho que li, por alto, que cerca de metade, pouco mais, pouco menos, das pessoas economicamente ativas no Brasil no momento atual, são trabalhadores informais. Autônomos, biscateiros, micro-empreendedores sem CNPJ, e muitos entregadores de comida, em suas motos e bicicletas. 

Pois bem, com a peste, e o isolamento social decorrente, os entregadores de comida se tornaram uma categoria de trabalhadores que continuou ativa e necessária. Sendo que no meio da dêbacle econômica resultante do isolamento social, uma das alternativas deixadas aos restaurantes e lancherias é justamente a comida a ser entregue em domicílio, ou retirada no estabelecimento conforme agendamento. 

Eu nunca fui um grande cozinheiro. E no atual momento tenho dependido de lanches, comida congelada e de sanduíches. E tenho tentado recorrer aos "deliveries".

Mas as experiências não têm sido boas. 

A primeira, dessas duas semanas de isolamento social, gerou um prazo de duas horas para que fosse entregue um pedido, de um estabelecimento a cerca de quatro quilômetros de onde moro. Mas isso, acabou sendo algo razoável. O estabelecimento não prometeu um tempo de espera, e eu ingenuamente fui esperando, esperando, esperando, até que, duas horas após o pedido, o lanche chegou.

A segunda experiência foi pior. Bem pior. 

Através de um aplicativo, equivalente a "eu comida", fiz um pedido a uma famosa lancheria de "fast food". Em tempos idos essa lancheria era tão "fast", que houve um tempo em que sua propaganda desafiava o cliente. Se este, no balcão, que não recebesse seu pedido em um (1!) minuto, não precisaria pagar por esse pedido. Isso deve ter sido pelo início dos idos dos anos 1990. Bom, pelo "eu comida", fiz um pedido a essa lancheria. Era próximo de 18h30min, e a promessa da entrega era para cerca de 55 a 65 minutos mais tarde. Passaram-se os 55 minutos, os 65 minutos e o aplicativo informou que o pedido atrasaria. Uma hora e meia depois e nada. Tentativas de reclamação junto ao aplicativo infrutíferas. Por fim, após duas horas de atraso, fui informado que meu pedido havia sido cancelado. Quanta eficiência!

Recorri a um aplicativo concorrente. Um cujo nome lembra a palavra "feliz" em inglês. Depois de quase três horas aguardando o pedido anterior que se frustrara, o novo pedido estava prometido para cerca de 50 minutos após o horário do pedido. Chegou o momento, e nada. Nesse caso, pelo menos, o telefone do fornecedor foi divulgado, e foi possível entrar em contato. Com um atraso de 45 minutos, questionei sobre o lanche solicitado. Sem surpresas, o atendente disse que estava pronto, e sendo despachado. Devia ser verdade. Com cinquenta minutos de atraso, afinal, recebi o lanche, a refeição esperada. 

Então, desde o meu pedido inicial, por volta de 18h30min, até o momento que recebi o lanche, após as 23h, lá se foram quatro horas e meia. 

Quanta eficiência!


03/04/2020.

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