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Mostrando postagens de maio, 2021

Alívio

Sexta-feira, final de tarde. Ainda lendo o jornal. Também, só eu mesma para assinar jornal do centro do país em papel em tempos de comunicações instantâneas.  Dinossaura. Ou jacaroa, como está em moda.  Leio o texto de uma colunista falando de sua ancestralidade judaica, e de como só com os filhos adultos, a mãe lhes revelou que tinha sido refugiada do nazismo.  Em outra coluna, uma escritora, que costuma criar hipérboles a partir de suas vivências, relata seus dias de doente de covid-19. Muito sofrimento. São mais de 400 mil mortos, quando leio, e contando.  E um artigo de defensoras públicas lembrando os quinze anos do massacre de maio de 2006 em São Paulo. Primeiro uma centena de policiais e agentes penitenciários assasinados, supostamente a mando do PCC, depois a reação e 400 executados em uma semana, provavelmente por policiais organizados em esquadrões da morte.  Afff... Uma mensagem no celular.  Minha neta me avisa que vem matar a saudade de mim! Oásis de minha vida!  25/05/2021

Diário da Peste (XXIII) - Sabor Especial, Fruta da Estação

Semana passada entraram as primeiras bergamotas desta estação aqui em casa.  Cá estamos em quinzembro de 2020 (ou maio de 2021, se você quiser). Estou há quatorze meses em home office. Pois é, presidente, sou um dos seus idiotas.  É bom ter as bergamotas em casa novamente.  No outono e no inverno passado elas foram um alimento fundamental. Comi bastante. Aliás, fazia tempo que eu não comia tanta bergamota. Não pesei. Mas foi bastante. Mais do que eu estava acostumado em invernos de outrora. Vitamina C no organismo.  Faz umas duas semanas tivemos um período de longas amplitudes térmicas. Os dias de outono começavam a 7 ou 8ºC, iam a 21 ou 22ºC na máxima do dia, e retornavam ao frio ao anoitecer.  Agora, uma frente fria trouxe vento e baixou geral as temperaturas.  Hora de trocar a cerveja pelo vinho; o gin tônica pelo rabo de galo . Hora de beber chá; ou de consumir o refrigerante sob temperatura natural, sem gelar.  Há sol. Com a persiana aberta e o vidro fechado posso comer bergamota

Diário – Leituras – Prende o Velhinho e outras trapaças

  Se trata de um livro de crônicas e memórias de Jorge Luiz Bledow. São 23 histórias. Crônicas que se lê com a leveza possível nesses dias de peste.  A propósito algumas das narrativas são justamente a respeito da pandemia em que estamos envolvidos desde março de 2020.  O livro abre com uma narrativa a respeito da nossa dificuldade geral de lidar com baratas. Sim o inseto.  Passa pelo cotidiano contaminado (opa!) pela covid-19, que restringe trajetos, paralisa o prazer do esporte, e torna uma ida ao supermercado uma quase operação de guerra, com necessidade de planejamento e cronometragem.  Passa, além disso, pelas lembranças do autor, como na crônica “O Tempo Levou”, com a qual quem é jovem há bastante tempo há de se identificar, e relembrar a Porto Alegre desse passado recente distante.  Termina com “Viagem Fantástica em 1975”. Fantástica mesmo. A incrível história de uma viagem de formatura de um grupo de estudantes que sai do interior de Palmeira das Missões, passa pelos litorais d

Diário - filmes - O Primeiro Homem

Depois de muito tempo voltei a assistir um filme. Fazia muito tempo que eu não parava para ver um longa metragem, pois tenho estado cheio de telas eletrônicas. Fiquei concentrado em leituras e vídeos de cerca de quinze minutos. Mas após muita insistência de meu filho me rendi a ver "O Primeiro Homem" ("First Man", Estados Unidos, 2018), uma recriação da vida de Neil Armstrong, que foi o primeiro homem a pisar na superfície lunar. Ryan Gosling interpreta Armstrong.  Para completar a piada que ninguém presta atenção ao segundo, o segundo também está lá, é Buzz Aldrin, interpretado por Corey Stoll. A propósito parece que o nome do brinquedo Buzz Lightyear recebeu esse nome em homenagem ao segundo homem na Lua.  Como um bom filme estadunidense, é um filme de superação, mas também um filme sobre perdas, a começar pela filhinha de Neil logo nos minutos iniciais do filme.  Um bom filme. Um drama sobre um homem superando as suas perdas e as aparentes limitações.  17/05/2021

Méqui

Quase duas da tarde e eu na maior fome.  Faz tempo que saí de casa, e não dei sorte na minha correria.  E esse bairro aqui na zona norte não dá sorte. Sempre tem muita gente em volta. Não consigo dá minhas volta em paz.  Agora tá o playboy ali estacionando a Tucson grandona. E ele tá com um saquinho de méqui.  Hummm... E agora não tem ninguém aqui na volta. Na boa, é só chegar discreto.  "Aí, playboy, perdeu. Passa o saco!" "Ah, cara, tu tá brincadeira! Tu quer me roubar o meu almoço?" "Isso aí! Passa o lanche no pacote." "Ah, nem vem! Isso aí é pegadinha! Tu só tá com o dedo aí no teu bolso." Porra! O cara tentou me acertar um soco?  "Eu tava de boa, cara! Tô com fome. Só queria o lanche." ... "Cara, tu me deu um tiro? Socorro! Socorro!" "Sai fora, playboy! Dá o lanche aqui. Já que tu quis me azará, já vou levar tua carteira, celular e o carro." Carro automático. Mais fácil.  Otário. E eu só queria o lanche! Pra que

Noite passada sonhei contigo

Esta noite (1 para 2 de maio de 2021), sonhei com minha irmã. Parecia que estávamos em uma praia. Na areia da praia. Conversei não sei o quê com ela. Também tive a sensação da presença de nossa mãe no sonho.  A figura de minha irmã era muito mais nítida que a de minha mãe. Teria isso a ver com minha irmã ter se ido em 2018 e minha mãe em 1995? Mistérios da mente.  Acordei sobressaltado, pensando ver alguma coisa a minha frente, mas era só a estante com seus livros. Me dei conta então que a minha irmã, tão presente alguns segundos atrás, era apenas fruto de um sonho.  É um dado trágico de nossa existência o fato de estarmos fadados a ver partirem nossos entes queridos. É um dado natural, mas saber disso não torna a dor e a saudade menores (e, sim, se algo quebra a ordem natural e um filho parte antes de um pai a tragédia é ainda maior).  O sonho reativou saudades, trouxe à tona a dor.  Provavelmente movido pelo meu inconsciente, coloquei a tocar Anoche Soñé Contigo. Pero, al contrario d

Saúde!

  No tédio de uma tarde de sábado, os dois amigos cinquentões se encontraram novamente como costumavam fazer havia bastante tempo, e continuavam fazendo apesar da peste.  Logo que Erasmo chegou ao apartamento do Lino, perguntou, “E aí? Qual a cerveja que tu comprou?” “Ih, rapaz! Não comprei cerveja.” “E o que a gente vai beber?” “Tem esse pouquinho de rum aqui. E tem uma garrafa de cachaça.” "Bah!" "Vamos ver. Vamos ver quem aguenta melhor. Eu vou servir o rum em copo de martelinho. Vamos beber de um tiro só." "Tu não vai dar nem para a saída." E assim Lino serviu dois martelinhos de rum.  Os dois emborcaram os copos de uma vez. Ambos fizeram a careta característica que engoliram uma bebida que desceu queimando pela garganta.  "Essa não deu nem para começar.", falou Erasmo.  "É. Não deu mesmo.", concordou Lino e serviu novamente os copos. A garrafa de rum se esgotou.  De novo viraram a bebida em um único tiro. Novos rostos de garganta q

Diário da Peste (XXII) - Sujeito de Sorte

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O dia 8 de maio de 2022 se apresentou em Porto Alegre como um belo dia de sol, um agradável dia de outono.  Eu acordei tarde, e fiz o desjejum com frutas.  Olhei notícias na internet, e logo tratei de preparar o almoço. Após o almoço saí a dar minha caminhada diária. Caminhar diariamente é uma recomendação médica e um hábito que estou tentando manter. Alcançada a meta da caminhada, me dirigi ao novo posto de vacinação, que foi montado pela secretaria municipal de saúde perto de onde moro, no estacionamento a céu aberto de um hipermercado. Uma tenda patrocinada por farmácias e entidades de classe, com apoio do exército.  Naquela linda tarde de sol, por volta de quatorze horas, a fila para receber a vacina contra a covid-19 não era grande.  Estranhamente para mim mesmo, fiquei algo tocado em estar em uma fila para receber a primeira dose de uma vacina.  A fila andou rápido. Verificada a minha documentação, e confirmada a minha idade, 54, e comorbidade, diabetes mellitus, fui encaminhado

Dúvida

  João viu em uma rede social que o blogueiro que ele seguia e admirava, um homem pio e íntegro, morreu repentinamente, aos 45 anos de idade, em decorrência de um AVC.  João aos 59 se perguntou, de novo, por que o outro e não ele? 06/05/2021.

Diário da Peste (XXI) - Some days are better than others

  "Some days are dry, some days are leaky Some days come clean, other days are sneaky Some days take less, but most days take more Some slip through your fingers and onto the floor (...) Some days are better than others" Vão passando os dias da peste, e os dias da peste parecem intermináveis.  E vamos vivendo nossas vidas, aqueles que sobrevivem, como um cálice que vai se enchendo por gotas, uma após a outra. Hoje é um dia em que o cálice transbordou.  Algum maníaco, resolveu pegar um facão, e matou três crianças quase bebês, e duas mulheres, cuidadoras das crianças, no oeste de Santa Catarina. Uma coincidência maligna talvez, o nome da cidade onde o massacre ocorreu se chama Saudades. Anestesiados por 400 mil mortes, somos chamados à chamados a comoção pelo assassinato de três crianças com menos de três anos de idade. No país mais violento do mundo, as crianças também sucumbem.  No país do racismo cordial, o fato do assassino ser chamado de jovem ou adolescente (o assassino

Diário da Peste (XX) - O chuveiro pifou

Atenção: esta crônica contém marcas registradas. Pode muito bem soar como merchã. Esteja a raríssima leitora, o raríssimo leitor avisado. Sábado à noite, ao ligar o chuveiro percebi que a água não esquentou. Acontece com relativa frequência. É possível até pensar que melhor acontecer no outono que no inverno.  Ainda mais que tivemos quatro ou cinco dias de outono propriamente dito, nesses 45 dias de outono. Os demais foram dias de verão atrasado ou primavera muito adiantada.  Enfim. Provavelmente resistência queimada.  Faz algum tempo que elegi como chuveiro elétrico de minha preferência a “Gorducha”, da Corona (quem lembra? “Apanhe o sabonete, abra uma torneira e de repente a gente sente, Duchas Corona, um banho de alegria num mundo de água quente...”, ou algo assim), pela facilidade de troca da resistência. Desenrosque a base, onde ficam os furinhos que distribuem a água; retire o “copo” que envolve a resistência; e retire a resistência. Coloque a resistência nova, e eis o chuveiro f

Primeiro de quinzembro de 2020

  Em um sábado entramos em maio de 2021, ou, quem sabe, quinzembro de 2020, em um ano passado sem fim (você sabe, né? Novembro, dezembro, onzembro, dozembro, trezembro, quatorzembro, quinzembro).  Esta semana devemos estar mais ou menos a meio caminho entre o início do outono e o início do inverno.  Em Porto Alegre, cerca de duas horas separam o solstício do inverno, ou o dia mais curto do ano, do solstício de verão, o dia mais longo. No solstício de inverno o sol se põe logo após as cinco e meia da tarde (da noite?); e no de verão, um pouco antes das sete e meia da noite (da tarde?).  Por que falo isso, se esses fenômenos se repetem ano após ano?  Não sei.  Talvez porque, como eu disse, me sinta meio aprisionado em um ano que não termina.  Tendo que tomar cuidados sanitários que eu nunca tinha visto.  Tendo que ser um pouco mais paranoico do que já costumo ser, pois sempre temos vivido em um país violento com guerra civil não declarada .  Agora, além disso, vivo cercado pela peste, em