Leituras Atrasadas - Estação Carandiru


Leituras Atrasadas - Estação Carandiru

Estação Carandiru é um livro no qual o Dr. Drauzio Varella narra parte de sua experiência como médico voluntário na Casa de Detenção do Carandiru, em São Paulo. Este livro já inspirou um filme cinematográfico e uma série televisiva.
É  mais uma daquelas leituras que eu chamo de atrasadas, pois são livros de ocasião, do tipo que parece por um momento que está todo mundo lendo. No caso deste livro isso foi lá por 2001, ou 2002. Eu me lembro que ganhei em alguma confraternização de amigo secreto, por ocasião de algum Natal lá por 2002 ou 2003. Mas só agora priorizei esta leitura.
E é uma leitura saborosa, no sentido de ser um livro que se lê, como se diz, em uma sentada (no meu caso, a leitura demorou uns três dias). Tão saborosas quanto podem ser histórias sobre detentos numa penitenciária de São Paulo. São pequenas crônicas sobre o cotidiano naquela penitenciária, onde o Dr. Drauzio Varella conta alguma situação médica sobre algum dos detentos, e muitas vezes aproveita para explicar o motivo pelo qual o camarada chegou àquela situação. Antes disso ele ainda explica como chegou a praticar trabalho voluntário de prevenção à AIDS e outras doenças venéreas ali, e explica em linhas gerais como funcionava o presídio, sua entrada, seus carcereiros, a população carcerária dividida entre os diversos pavilhões do presídio.
E o que se vê no retrato mostrado pelo Dr. Varella? Condenados pobres em geral, moradores de periferias e favelas, dos estratos mais baixos da população. Pequenos traficantes, pequenos ladrões, alguns assassinos. Mas em geral, todos são tratados como gente por Varella, isto é, não como monstros, o que faz com que boas histórias sejam contadas.
Uma curiosidade que o livro narra é a similariedade de ambientes frequentados por uma parte dos condenados, e pela base das forças policiais. Há pelo menos uma narrativa em que uma mulher de um condenado se envolve com um policial. E uma outra de um condenado que matou um policial militar também por causa de mulher.
Por fim, o Dr. Drauzio Varella narra o que teria acontecido na rebelião do pavilhão 9, no qual oficialmente 111 presos foram executados (o doutor informa que os sobreviventes estimam que até 250 presos tenham sido executados). A confusão havia começado por conta de um desentendimento de um jogo de futebol entre os times dos detentos, que descambou para uma briga. O batalhão de choque da polícia militar foi chamado para por ordem no presídio, e para tanto fuzilaram presos à vontade, sem que estes presos tivessem de fato oferecido resistência. De fato, a narrativa do livro é que os presos foram fuzilados enquanto tentavam se esconder nas celas. Os sobreviventes foram espancados. Após a matança inicial, alguns dos que tinham carregado os cadáveres para serem levados para o necrotério, ao final de sua tarefa também foram metralhados. E isto não aconteceu durante a ditadura militar. Foi um evento acontecido no quadro de um estado de direito constitucional, no Brasil da Constituição Cidadã de 1988.
Um livro muito bom, desde que você esteja com vontade de ler a respeito do que acontece num presídio brasileiro.


VARELLA, Drauzio.
Estação Carandiru. São Paulo: Companhia das letras, 2004.


05/06/2012.

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