Sobre obituários e macróbios


Diz o amigo Ed que sou o cara que lê obituários. E, de fato, leio. 

E os obituários que acho mais fascinantes são os das pessoas centenárias. 

Por exemplo, a Dona Maria José Gomes faleceu em 26 de março passado, aos 111 anos. A manchete de seu obituário nos informa que ela atribuía sua longevidade ao fato de não ter tido marido. E no decorrer dos fragmentos biográficos expostos, podemos dizer que nem marido, nem filhos. Mas teve sobrinhos e sobrinhas e netos por afetividade. Foi professora e bordadeira. 

Outra pessoa, acho que a que mais impressionou com os fiapos de biografia em seu obituário foi Dona Carmen Bobbio Guasti.  Ela faleceu em 28 de junho passado, aos 103 anos de idade. Nascida em 1920, na Itália, mudou-se com a família para a Líbia, durante a dominação italiana da região. O pai era general do exército. Nesse período desfrutou do fato de ser parte da elite que dominava a então colônia, e ficamos sabendo que ela frequentava bailes, e, após os bailes, anotava em uma caderneta o nome dos rapazes que a tiravam para dançar. Nesse perfil que me fascinou muito também pelo que não é exposto, nos é informado que, com o início da Segunda Guerra, a família retornou para a Itália. Lá, ainda durante a guerra, ela estudou e formou-se em medicina e odontologia. Nos anos 1950 casou-se e mudou-se com o marido para a cidade de São Paulo, onde ela se envolveu com o voluntariado na comunidade italiana. 

Dona Maria José era uma jovem de uns 17 anos, quando Getúlio Vargas acabou com a República Velha em 1930.

Dona Carmen viveu a juventude com seu pai a serviço de Mussolini. Fez seus estudos universitários sob os bombardeios aliados sobre a península. 

E ambas acabaram morrendo velhinhas, nesta periferia do mundo. 

Tiveram vidas longas. Mas ainda assim, vidas breves. 



03, 04/08/2025. 

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