Diário - leituras - Ascensão e Queda das Grandes Potências


Diário - leituras - Ascensão e Queda das Grandes Potências


Esse livro foi lançado no Brasil no final da década de 1980, e, se não estou enganado, ainda é uma obra de referência para os cursos de Relações Internacionais no Brasil. No final dos anos 1980 ainda não existia a Internet como a conhecemos hoje. A União Soviética ainda era uma realidade, embora talvez pudesse estar mudando. Foi nessa época que as palavras russas “glasnost” e “perestroica” se tornaram conhecidas por aqui. Mas mesmo com a possível reorganização da União Soviética, ainda parecia que a Guerra Fria iria durar por muito tempo.

O livro procura fazer um balanço dos principais impérios mundiais desde o século XV até o final do século XX, terminando justamente nas análises de Estados Unidos e União Soviética, o que, afinal, talvez tenha sido uma das razões do relativo sucesso de vendas que teve na época.

Como a análise é abrangente e sintética, e válida, o livro continua vendendo até os dias de hoje.

O autor explica sua metodologia. No século XVI, a China era um país mais rico que a Espanha ou a Inglaterra, contudo o princípio que o autor levou em consideração foi o desenvolvimento histórico que levou os países da Europa a se tornarem os países mais desenvolvidos ainda hoje, isto é, a partir do século XVI, na Europa começaram a crescer os rendimentos dos campos, a crescer a importância do comércio, a urbanização, e os governantes começaram a conseguir se financiar com parcelas menores dos rendimentos extraídos da população.  A partir desses critérios, ele levou em consideração os estados que mais se destacaram nesse contexto em que os países da Europa, e depois os Estados Unidos, acabariam por ultrapassar, por exemplo, a rica China do século XVI.

Dentro desse contexto, ele começa por analisar a Espanha do século XVI. No contexto do século XVI, a Espanha não era a Espanha que conhecemos hoje. Era um dos territórios de uma família real, a casa de Habsburg, ou os Habsburgos, que dominava o que então era a Espanha, na verdade os reinos de Castela e Aragão, mais os territórios dos Países Baixos, que abrangiam então tantos os atuais Países Baixos quanto a atual Bélgica, mais o sul da Itália, a Áustria e o Sacro Império Romano-Germânico. Fora da Europa, o governante de Castela era também o soberano da América Espanhola. Como se pode constatar um território extensíssimo.

O soberano que dominava sobre toda esta terra, era uma ameaça para os demais reinos europeus, e assim ele sofria o antagonismo do rei da França, ou do rei ou rainha inglesas. No contexto europeu, quem fosse o maior entre os europeus, seria o potencial maior do mundo.

É por isso que o autor não faz análise de Portugal no livro. Portugal tinha seu grande império colonial, com sua porção da América, isto é, o Brasil, mais territórios na África, e na Ásia. Mas não exercia influência importante sobre seus vizinhos europeus.

No decorrer dos séculos alguns países irão se suceder no papel de mais importante da Europa.

A segunda metade do século XVI marca o auge do poder espanhol, que começa então uma lenta decadência.

Os impérios que sucedem a Espanha são os Países Baixos, agora sim, já muito similar ao atual, e a Inglaterra, que são os países dominantes durante o século XVII. E a França vai sempre ter um papel importante desde o século XVI até a metade do século XX.

O século XVIII verá o crescimento da França, tanto com o rei Luís XIV, quanto após a Revolução, com as Guerras Napoleônicas.

A derrota de Napoleão e os tratados após aquelas guerras marcam a ascensão da Inglaterra, que durará por todo o século XIX, até o início do século XX.

Sendo que é ainda na primeira metade do século XX que os Estados Unidos se tornam o país mais industrializado do mundo.

O autor se preocupa sempre em mostrar como a economia é importante para a capacidade militar de cada país, e de como o progresso tecnológico vai mudando a caráter de cada guerra ao longo do tempo.

Assim, se no século XVI a Casa dos Habsburgos lutava na Europa Central para manter a unidade do catolicismo de então (e a Guerra dos Trinta Anos - 1618-1648 foi a última guerra de religião da Europa), e financiava boa parte de seus exércitos com a prata da América;  no início do século XIX, Napoleão pode mobilizar os agora cidadãos (e não mais súditos) franceses a “libertar” a Europa com exércitos maciços, enquanto financiava parcialmente suas campanhas militares com recursos dos países ocupados.

A Inglaterra pôde desfrutar do fato de ser a iniciadora da Revolução Industrial, e com isso vender seus produtos (fruto da industrialização) a todo mundo. Isso fortaleceu sua capacidade econômica, e, também militar. Sua marinha foi a maior do mundo durante a maior parte do século XIX. Durante esse século a Europa teve relativamente menos guerras que nos séculos anteriores, o que talvez ajude a explicar o tamanho desse predomínio.

O final do século XIX e o crescimento da tecnologia na área militar traz aos países o desafio do seu desenvolvimento social. O autor ilustra isso com os casos da Prússia e da Rússia de então. O exército prussiano se tornou mais poderoso à medida em que a alfabetização foi se universalizando na Prússia. O exército russo era maior mas menos efetivo pois seus recrutas ainda eram em grande parte analfabetos, incapazes de interagir com as novas tecnologias de guerra que foram surgindo naquele final de século.

A Itália da primeira metade do século XX falhou em suas guerras parcialmente pelo mesmo motivo: economia pouco industrializada e largamente voltada à atividade agrícola, e população em grande parte analfabeta.

No início do século XX os Estados Unidos já surgiam como a possível maior potência econômica do mundo, o que, segundo o autor, aconteceria já na década de 1920.

Por fim, o autor já via problemas no desenvolvimento econômico da União Soviética, que fatalmente levariam a problemas em sua capacidade militar, desde que a economia soviética praticamente estagnara desde os anos 1960.

Por fim, o livro mostra como os impérios ascendem e caem. E como essa queda, apesar de mais ou menos evidente, pode se estender por um longo período de tempo. É possível que o auge do poderio inglês tenha sido no final do reinado da Rainha Vitória, em 1901. A sua decadência começou aí e foi se estendeu pelo século XX. Foi mais sentida com os reveses durante as Grandes Guerras e com a Independência da Índia, em 1947. Em 1950 a Inglaterra era muito menos importante que em 1901, mas ainda era uma potência. Podemos dizer que hoje ainda é. Mas de 1901 a 1950 50 anos se passaram, e isso possivelmente era mais que a expectativa de vida de um inglês em 1950. Fazendo um paralelo com os nossos dias, pode ser que os Estados Unidos já tenham passado do momento de seu próprio apogeu. Mas ainda pode demorar muito tempo para que chegue a um tamanho relativo equivalente à Inglaterra de 1950, se é que algum dia isso acontecerá.

“Ascensão e Queda das Grandes Potências” é um bom livro. Aumenta o conhecimento de quem o lê, e faz pensar bastante.



KENNEDY, Paul. Ascensão e Queda das Grandes Potências. Rio de Janeiro: Campus, 1989.


19/03/2013.

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