Diário
- leituras - O Século Soviético
A União Soviética foi um marco fundamental do
século XX. Ela surgiu após uma revolução que gerou a segunda
experiência socialista na história (a primeira foi a Comuna de
Paris, de 1870, surgida na esteira da derrota francesa para os
prussianos e esmagada após o armistício da Guerra
Franco-Prussiana), num momento de grande efervescência do movimento
operário e dos partidos que procuravam representar a classe
trabalhadora. E por conta dessa busca do socialismo praticamente
expulsa do "pacto das nações". Como o Haiti no início do
século anterior o pais foi isolado pelos demais países. Mas
diferentemente do Haiti pôde resistir ao assédio por conta de seu
extenso território, portador de uma vastidão de recursos.
Esta experiência do socialismo, apontava para um
governo que dizia trabalhar no interesse dos trabalhadores do mundo
todo. Por conta disso, foi considerada uma esperança de redenção
para estes mesmos trabalhadores, e angariou simpatias e aliados por
todo mundo. Também por conta disso, disparou rancorosas reações,
cuja mais saliente foi o anti-comunismo abraçado pelos Estados
Unidos no decorrer do governo Truman, e por todos os seus sucessores.
O livro de Moshe Lewin, "O Século
Soviético", é uma tentativa de analisar esta experiência
iniciada em 1917 e terminada em 1991.
Lewin mostra as condições da Rússia do início
do século, e toda a série de circunstâncias que que acabaram por
levar os bolcheviques ao poder, os anos de guerra civil (1917-1921),
a ascensão de Stálin, as mudanças pelas quais passou o país com
os sucessores de Stálin a partir de 1953, até o fim da União
Soviética, com o fracassado golpe de estado de 1991.
Lewin informa que foi durante a União Soviética
que se deu a urbanização e a industrialização do país. Mas para
que o país pudesse se urbanizar e industrializar, ele teve que
vencer o desafio da educação, pois a Rússia czarista tinha grande
parte de sua população analfabeta. Além disso, como já foi dito,
a União Soviética ficou isolada dos demais países do mundo. Assim,
enquanto o país se urbanizava, era necessário que fossem criados
incentivos para que parte dos trabalhadores ficassem no campo, pois
era preciso abastecer de alimentos as cidades.
E isso é outra coisa que podemos ver que o autor
se esforça para ver: como a população em geral reagia ao sistema
soviético. E segundo Lewin, as pessoas tinham bastante autonomia
para deixar o campo pela cidade, ou ir de uma cidade para outra em
busca de melhores oportunidades de vida. Porque, afinal, se não
houvesse pessoas para trabalhar, não poderia haver governo que
resistisse.
O autor comenta sobre como Stálin transformou o
partido socialista numa espécie de seita ou religião, da qual ele
se tornou o líder máximo, seu sacerdote e profeta. Assim ele pôde
se desfazer de seus rivais, como uma religião se livra de alguns
seguidores ao chamá-los de "heréticos". Além disso,
segundo Lewin, Stálin governou pelo método paranoico, desconfiando
de todos, e sempre atribuindo a algum subordinado eventuais fracassos
do país.
E foi sob Stálin que o país teve o seu momento
mais totalitário, quando houve o maior número de encarceramentos e
fuzilamentos de opositores.
Com a morte de Stálin, tudo se suaviza. Inclusive
os derrotados nas lutas intestinas da cúpula dirigente, são apenas
afastados do poder, mas permanecem vivos e saudáveis. No máximo
vigiados.
Ainda a propósito dos cárceres soviéticos, no
durante o governo de Stálin, Lewin situa em cerca de 2 milhões o
total de encarcerados do período, e que cerca de 700 mil pessoas
morreram nesses cárceres entre 1931 e 1947. O número é expressivo
mas fica longe dos "20 milhões de mortos" sob Stálin,
como a indústria do anti-comunismo bradou por tanto tempo (existem
algumas viúvas do anti-comunismo por aí que ainda acreditam nesses
alegados 20 milhões de mortos).
O livro é fruto de pesquisas nos arquivos russos,
possui um índice remissivo, e apêndices com estatísticas do
regime. Pena que o autor não forneça uma bibliografia no final. Em
todo caso, um livro imperdível para quem se interessa pela história
da União Soviética.
LEWIN, Moshe. O Século Soviético. Rio de
Janeiro: Record, 2007.
08/03/2012.
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